Mas repare que eu falei quase igual. Nunca é 100% igual. Sempre há pequenas diferenças entre a gramática dos pais e a gramática dos filhos. Podem ser diferenças muito pequenas, como por exemplo: os pais falam uma determinada estrutura só 40% das vezes, e os filhos já falam a mesma estrutura 50% das vezes. Essa diferença não vai ser notada por ninguém, mas ela existe. E depois de muitas gerações, o padrão acaba sendo outro. As mudanças são pequenas, mas são cumulativas, e com o tempo são capazes de mudar a gramática da língua. Mas de que tipo de mudanças "gramaticais" eu estou falando? Para dar um exemplo, enquanto eu escrevo este texto, estou sempre escrevendo sentenças como: "Tem muita exceção na fala dos adultos". E depois eu tenho que "corrigir" essa sentença para dizer, "Há muitas exceções na fala dos adultos". Por quê? Todo mundo fala "tem", mas eu preciso escrever "há". Isso acontece porque a escrita é mais conservadora do que a fala. A fala já mudou, mas a escrita ainda não. Antigamente, as pessoas usavam "há" na fala, também, como na escrita. E ainda em Portugal é assim que se fala. Hoje, no Brasil, isso mudou. Ninguém mais fala "há", nem os adultos! E essa mudança começou com as crianças brasileiras. Por isso, com o tempo, a língua muda. Nem precisa ter contato com outras línguas para mudar. A língua muda sozinha. Muda porque as crianças são muito criativas quando adquirem sua língua materna. Sempre tentam fazer uma coisa mais sistemática. É por isso que se fala que esse processo de mudança é interno à língua.