top
Morfologia
Além disso, é preciso distinguir entre a possibilidade de aplicação da regra e a sua aplicação efetiva – o que Basílio et alli (1993) chamam de diferença entre condições de produtividade e condições de produção. As condições de produtividade dizem respeito exclusivamente ao conjunto de restrições que a regra coloca sobre suas bases e seus produtos. Por exemplo, a formação de substantivos deverbais (isto é, formar um substantivo a partir de um verbo) dispõe de várias regras em português, dentre as quais a regra -ção e a regra -mento. Estas duas regras são produtivas no português brasileiro, embora a incidência de cada uma delas varie; num certo número de casos ambas podem ocorrer (e efetivamente ocorrem como internação e internamento), mas há casos em que só uma ou outra pode ocorrer: se o verbo que será base da regra termina em -ecer (como florescer), a regra a ser acionada é -mento (e o produto é florescimento); se um verbo terminado em -izar é tomando como base (por exemplo, realizar), a regra acionada será -ção: realização. E aqui não é possível falar em diferentes graus de produtividade. Por outro lado, -agem é uma regra menos produtiva que -ção ou -mento, porque o conjunto de restrições que ela impõe sobre as bases é maior (apenas verbos de ação concreta podem se candidatar a base desta regra) e ainda assim nem todos os elementos que satisfazem a esta restrição aceitam a formação: quando falamos em lavar as paredes da casa, falamos de uma lavação geral, não de uma lavagem geral, certo?
Já as condições de produção olham "para fora": olham regras semelhantes a uma regra dada – por exemplo, para regras que estão em competição com aquela primeira – e depois olham as condições discursivas mais gerais, as condições culturais, etc. Assim, embora a formação de substantivos deverbais disponha de regras produtivas em -ção ou -mento, quando falamos de terminologia científica, -agem é a regra acionada, e por isso temos lavagem (intestinal) ou clonagem e não *clonação ou *clonamento.