Como você já deve ter percebido, a linguagem tem importância constitutiva nessa ciência. É relevante, portanto, que você tome conhecimento dos dois paradigmas que têm orientado os estudos lingüísticos: o paradigma formal e o funcional. Importa, nessa discussão, que você entenda que a vertente formalista vê a linguagem como um fenômeno mental e a estuda como um sistema autônomo e independente de fatores externos ao texto, ao passo que a vertente funcionalista considera a linguagem um fenômeno eminentemente social e, desse modo, a estuda em relação à sua função social. Voltando à discussão das características externas à linguagem que terminam por influenciar nossas práticas discursivas . E agora? Em qual das duas concepções de linguagem (formalista ou funcional) você acha que se embasa a Análise do Discurso? Bem, após a discussão até o momento empreendida, julgamos não ser difícil para você responder a essa pergunta, certo? É claro que a Análise do Discurso se apóia na vertente funcional de linguagem. Para os analistas do discurso, importa não somente a situação (as situações) em que se usaria cada qual dos discursos exemplificados anteriormente, mas, também, a quem poderíamos nos dirigir com cada uma das formas utilizadas (sugestão e comando), que representações da realidade subjazem em nosso uso de linguagem; enfim, o que fazemos com a linguagem. Vamos adiante? Identificaremos, no próximo item 1.2, as origens da Análise do Discurso. Tenha sempre em mente o conceito de discurso, bem como as quatro dimensões da linguagem de que tratamos até agora.
PARADIGMA FORMAL Para o formalismo a língua é abstraída de suas condições de produção. Os formalistas saussureanos distinguem linguagem (faculdade humana que permite ao indivíduo a comunicação verbal), língua (sistema autônomo) e fala (execução individual da língua) e elegem a língua como objeto de estudo da Lingüística. Os formalistas chomskyanos, por sua vez, estudam a linguagem, concebida como uma faculdade específica da mente humana, resultado de uma complexa interação entre vários sistemas ou módulos cognitivos, marcados por regras e princípios.
FUNCIONAL A concepção funcionalista de linguagem distingue-se da concepção formalista por focalizar a língua em uso. Nessa visão, características externas à linguagem influenciam o seu uso. Isso implica, por exemplo, considerarmos que há diferentes formas de comunicar uma mesma idéia, e a forma utilizada por um(a) falante ou escritor(a) depende de funções não inerentes ao sistema lingüístico. De acordo com essa vertente, transformar o cidadão em um(a) falante/escritor(a) competente é capacitá-lo(a) a usar a linguagem de forma adequada às mais diversas situações – cada qual com suas convenções – de uso, desde aquelas em que age como recebedor(a) até aquelas em que atua como enunciador(a) de um discurso, a quem, em ambos os casos, cabe construir sentidos acerca do que lhe é dito ou escrito ou ainda do que diz ou escreve.
PRÁTICAS DISCURSIVAS Podemos dizer a você, a título de ilustração: 1. “seria produtivo se agora você parasse e pensasse em duas diferentes formas de dizer a mesma coisa, para então refletir em que situação (situações) de comunicação você usaria a primeira ou a segunda forma”, ou ainda, 2. “agora pare e pense em duas diferentes formas de dizer a mesma coisa, e então reflita em que situação (situações) de comunicação você usaria a primeira ou a segunda forma”. Perceba que nossa intenção é que você, a partir desse simples exemplo, pare para pensar o quanto o contexto interfere em nosso uso de linguagem, por mais simples e ingênuo que um enunciado possa parecer. No primeiro caso: – “seria produtivo se agora você parasse e pensasse em duas diferentes formas de dizer a mesma coisa, para então refletir em que situação (situações) de comunicação você usaria a primeira ou a segunda forma” –, estamos sugerindo, de forma branda, uma atividade que julgamos interessante para a internalização da visão funcional de linguagem. No segundo caso: – “agora pare e pense em duas diferentes formas de dizer a mesma coisa, e então reflita em que situação (situações) de comunicação você usaria a primeira ou a segunda forma” –, já somos mais firmes em nossa colocação, usando sentenças imperativas. Essa alteração muda a função da linguagem utilizada: na primeira situação, há uma sugestão e, na segunda, um comando.