Já foi sugerido que a relação da comunidade surda com a língua escrita majoritária seja comparável a uma situação de diglossia em que (no caso do Brasil) a libras serve de variedade baixa e a língua portuguesa escrita serve de variedade alta. Vamos ver por que essa descrição não é muito útil e vamos compará-la com outra descrição que possa servir melhor, não só para essa situação, como também para outros casos de diglossia complexa. A primeira coisa que se pode notar é que a língua de sinais não é a língua da família da maioria dos surdos, diferente do que acontece com uma variedade baixa numa situação típica de diglossia. A pessoa surda numa família de ouvintes tem que desenvolver outros meios de comunicação com a família, às vezes por meio de um código simplificado de sinais caseiros, com algumas palavras do português. A língua de sinais, nesses casos, só vai assumir importância na vida da pessoa surda quando ela entrar em contato com a comunidade surda. A partir desse momento, a língua de sinais começa a se estabelecer como a língua do pólo da convivência informal e da expressão íntima. A escola, por sua vez, deve ter por objetivo expandir o uso do português dos seus alunos (no caso do Brasil), especificamente o uso de gêneros escritos e de fala mais formal; mas, diferentemente de uma situação de diglossia típica, o surdo brasileiro não aprende, em geral, nem na família, nem na escola, o português falado. Por esse motivo, o português aprendido na escola não fornece todos os recursos lingüísticos necessários para colocar a pessoa surda em pleno funcionamento dentro da sociedade majoritária. Para que isso aconteça, a libras precisa assumir também um papel de mediador com o pólo público e formal, tanto na escola (com a educação bilíngüe) quanto na sociedade (com o crescimento do bilingüismo em português e libras por parte de ouvintes).