| Conteúdo |
|
||||||||||||||||||||||
Fechar
Retomemos o exemplo dos concursos de fantasias. Como vimos, cada versão apresentada da rainha Cleópatra traria irremediavelmente a marca de sua localização no tempo e no espaço. Mesmo assim, essas versões foram avaliadas durante cada um dos concursos hipotéticos, em que os jurados, ao elegerem a melhor Cleópatra, elegeram, na verdade, aquela que consideraram a versão mais fiel à Cleópatra original. E o que seria, para cada grupo de jurados, a Cleópatra verdadeira ou original? Como já sugerimos, a Cleópatra verdadeira ou original seria exatamente o conjunto de suposições e características que, para cada comunidade interpretativa, representada pelos jurados, constituiriam o personagem histórico conhecido como Cleópatra. Obviamente, da mesma maneira que as Cleópatras escolhidas seriam diferentes entre si, dependendo da época e da localização do concurso, também seriam diferentes as características que cada comunidade interpretativa atribuiria à verdadeira Cleópatra. Além disso, como vimos, se pudéssemos observar a foto de uma de nossas hipotéticas Cleópatras da década de 20, não seria possível evitar que nosso julgamento se realizasse a partir de nossas próprias suposições e convicções. Assim, a versão considerada fiel à Cleópatra original por uma comunidade interpretativa de São Paulo, em meados da década de 20, não seria aceita por uma comunidade interpretativa da mesma cidade, sessenta anos. Vejamos como essas conclusões podem ser transferidas à questão da tradução (...). Em outras palavras, nossa tradução de qualquer texto, poético ou não, será fiel não ao texto original, mas àquilo que consideramos ser o texto original, àquilo que consideramos constituí-lo, ou seja, à nossa interpretação do texto de partida, que será, como já sugerimos, sempre produto daquilo que somos, sentimos e pensamos. |